quarta-feira, maio 17, 2006

A bomba


A bomba

Paulo de Almeida Ourives

De repente a porta se abre com tal violência que assusta a todos aqueles que se encontravam naquele recinto, imediatamente, todos olham para aquele sujeito louco que num brado grita:
- “Tenho uma bomba!”.
A partir desse momento, o caos estava instalado naquela sala, cadeiras voaram em direção as vidraças das janelas e o que se ouviu em seguida eram os estilhaços dos vidros caindo na calçada, cadeiras espatifando-se pelo chão, outras cadeiras caindo em cima de carros estacionados ao longo da calçada e aquela multidão de homens pulando por cima das mesas, ganhando o parapeito das janelas e fugindo pela rua tomando destino ignorado.
O homem que havia dado o grito e invadido aquela sala, ainda estava parado na porta, não conseguindo raciocinar sobre o que ele afinal tinha visto naqueles poucos segundos, muitos homens fugindo pela janela sem saber do que se tratava. Ele ainda segurava na mão esquerda o pequeno embrulho do tamanho de um livro, que estava embalado em um papel de presente e amarrado com uma fitinha cor-de-rosa.
Vestido com uma calça jeans surrada, um cinto preto velho que era grande demais para aquele homem alto e magro, e com uma ponta caindo pelo lado esquerdo. Nos pés, um tênis branco rasgado no lado interno, bem próximo do dedão de cada pé, como um sinal de que o dito cujo gostava de dar uns chutes em qualquer coisa. A camisa listrada de manga comprida estava aberta nos três primeiros botões, deixando a mostra a camiseta branca que estava vestida por baixo. As mangas da camisa listrada estavam mal dobradas e amarfanhadas, sinal de que o sujeito havia aberto as mangas as pressas e não tinha feito a dobra de maneira perfeita.
De repente, em meio aquele silêncio na sala, e um ou outro ruído vindo do lado de fora, o homem começa a caminhar pela sala, até que consegue encontrar uma mesa em bom estado, com uma máquina de escrever em cima.
Senta-se, e ao procurar o papel que deve estar em uma das gavetas daquela mesinha, ele percebe algo, um barulhinho estranho, como o de um telegrafista tentando emitir alguma mensagem para alguém. Então ele olha para a direita, estica o pescoço, procura em vão entre uma olhada e outra por entre as mesas, sem sair de sua cadeira, e não vê absolutamente nada. Dá então uma olhada para a esquerda, se contorce na cadeira para poder enxergar melhor ao seu lado e atrás dele, e também não vê nada.
Resolve então, levantar da cadeira e olhar por cima da máquina de escrever, e vê então debaixo de uma mesa, completamente de quatro, um cidadão com as mãos entrelaçadas sobre a cabeça, o queixo no chão, e aquele barulhinho estranho que era ele rangendo os dentes de medo.
O cidadão então levanta da cadeira, dá a volta pela mesa, abaixa-se e pergunta para o homem de óculos ainda em baixo da mesa o que ele está fazendo ali, e o baixinho então responde:
“Po-po-por fa-fa-fa-fa-vor ti-ti-ti-tira es-es-essa bom-bom-bomba da-da-daqui, que-que-que e-e-eu nã-nã-não que-que-quero mo-mo-mo-morrer po-po-pois e-e-eu a-a-ainda so-so-sou mu-mu-muito no-no-novo pra-pra mo-mo-morrer. Te-te-tenho mu-mu-mulher e-e-e tre-tre-três fi-fi-filhos to-to-todos pe-pe-pequenos”, gaguejava o baixinho, já se levantando e tremendo de medo feito vara verde.
O cidadão ouviu aquela explicação em silêncio e com tremenda paciência, bem diferente de como ele havia rompido por aquela sala há poucos instantes atrás, causando um verdadeiro pânico em todos aqueles que estavam naquela redação do jornal.
- “Mas eu só disse que tinha uma bomba!”, porque esse medo todo?, perguntou o cidadão.
- “Ma-ma-mas vo-vo-ce en-en-entra a-a-aqui des-des-desse je-je-jeito e-e-e a-a-ainda pe-pe-pergunta?”, vo-vo-ce pa-pa-parece mais um-um-um pa-pa-palestino com-com-com essa-essa ba-barba, di-diz que-que te-tem u-uma bom-bomba e-e nã-não quer que-que nin-nin-ninguém fu-fu-fuja?”, tentou explicar o baixinho de óculos já quase se acalmando, pois só de olhar para aquele pacotinho ao lado do cidadão, ele ficava completamente nervoso e não conseguia parar de gaguejar.
Até que o cidadão então, percebeu o olhar do baixinho para o seu pacotinho, e perguntou:
- “Mas, vocês estão com medo disso?”. Apontava para o pacotinho. “Esse é o presente que eu vou dar para a minha mulher! É uma caixa de bombons finos! Não há necessidade de ter tanto medo assim!”, explicou o louco cidadão.
- “Então qual é a bomba?”, perguntou o baixinho que nada mais era do que o chefe de redação daquele jornal.
E o nosso amigo então relata para ele, que “a grande notícia é que o Zelão Malvadeza não irá jogar a decisão do campeonato de futebol do bairro de Paciência. E com isso, o Zelão, que é o melhor jogador do time do Tranca-Rua Futebol Clube, não participará do jogo final, o que se conclui que o time dos Perebas Não Entendem Nada de Futebol Clube, terão a chance de ganhar o campeonato do bairro, considerando-se assim em uma autêntica zebra, pois os caras são muito ruins”.
O baixinho então já com aquele olhar característico de quem não gostou nada daquele assunto resolve então dar por encerrada aquela conversa e grita para o referido cidadão:
- “Tira sua bomba daqui e vai pra p. que pariu!”, gritou, apontando na direção da porta, para aquele cidadão que havia dado um verdadeiro susto em todos os repórteres que sumiram rua afora, acreditando que ele tinha uma bomba de verdade e faria tudo aquilo voar pelos ares.
- “Mas eu sou o repórter novo, e hoje era o meu primeiro dia!”, tentou argumentar o cidadão que já estava quase na porta.
- “Fora daqui! Não quero saber de Zelão, de Pereba e nem de Tranca-Rua e tenho muita raiva de quem sabe alguma coisa, portanto, caia fora daqui! Seu imundo! E não me apareça nunca mais!”, concluiu o chefe da redação.
Três dias depois, os repórteres voltaram para a redação, após ficarem sabendo que a redação do jornal ainda estava de pé, e que o louco que havia entrado naquela tarde era um repórter que o jornal havia acabado de contratar.
Um dos repórteres então chegou no ouvido do chefe da redação e perguntou se ele queria saber de uma novidade. Como o chefe gostava de uma novidade, ele condescendeu e quis saber qual a boa nova, e o repórter então concluiu:
- “O time do Tranca-Rua ganhou o campeonato de futebol lá em Paciência! É que o Zelão depois que viu que não tinha mais jeito em entrar para jogar a decisão resolveu escalar o seu filho, que joga muito mais do que o pai. E o time dos Perebas, além de perder o campeonato, tiveram dois jogadores expulsos, um deles era aquele louco!”, explicou o repórter.
- “Bem feito!”, resmungou o chefe da redação.

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