sexta-feira, maio 19, 2006

Essas crianças...


Essas crianças...

Paulo de Almeida Ourives

Existem momentos na vida da gente, que passamos por tantas situações que algumas delas ficam gravadas em nossa memória. Sempre ouvi dizer que o brasileiro, não possui memória, mas não é só o brasileiro em todo o mundo, as dificuldades financeiras, o desemprego, os problemas domésticos, etc. fazem com que as pessoas vivam o dia-a-dia de forma cada vez mais competitiva e isso acaba gerando um stress emocional tão grande que quando as pessoas vão para as suas camas dormir, elas acabam passando uma borracha em tudo o que viram ou que presenciaram naquele dia. Mesmo que no dia seguinte, a rotina seja a mesma, vejam as mesmas pessoas em ônibus, trens, metrô, nas ruas, no trabalho, nos restaurantes ou fast-foods, não importa, ninguém consegue se lembrar do que aconteceu no dia anterior, mesmo que haja um fato completamente estranho a rotina. Ninguém consegue guardar na memória, vive o fato, e acaba apagando da memória, como se fosse mais um daqueles inúmeros papeizinhos de propaganda que recebemos no meio da calçada.
Comigo acontece justamente o oposto, tudo o que me acontece, é guardado em minha memória computadorizada, meu computador pessoal é mais rápido e o winchester que possuo abriga cada vez mais informações e imagens audiovisuais que nem mesmo o melhor dos computadores (máquinas) que aí estão no mercado, conseguem guardar. Estou falando da minha memória, essa caixinha cinzenta que fica em meu cérebro.
O que estou dizendo é uma pura verdade, tanto que posso provar, algumas dessas crônicas, estão guardadas em minha memória por quase 30 anos. Isso mesmo, quase 30 anos, como por exemplo, “Um Natal marcante”, ou, “Uma partida de futebol”, entre as diversas crônicas deste livro. Outras crônicas são guardadas por momentos ou até mesmo horas depois em que crio o texto em meio a uma caminhada. Retenho elas na memória, e depois de algum tempo sento aqui em frente ao computador e datilografo, ou melhor digito, a mesma no meu computador. E que agora vocês tem a oportunidade de ler. Quando estiverem lendo, já terá se passado muito tempo entre o dia em que escrevi e o dia que vocês estão lendo.
Mas um dos momentos mais hilários que aconteceu comigo, em Vila Velha, eu reescrevo aqui, e tenho certeza que se vocês estivessem vivendo o momento que vivi, também iriam se assustar. Esta crônica foi publicada em uma das últimas edições da revista Momento no Espírito Santo e o seu texto é o seguinte:
“Outro dia, estava deitado fazendo a sesta como de costume, e, fui acordado com crianças à gritar assim:
- Não! Não vai não!
- Ai! Vai atropelar!
- Espera!
- Ai! Vai morrer!
- Não! Não atravessa, não!
Assustado, e naqueles poucos segundos em que me levantava até a chegada na janela da sala foram mil pensamentos, e a consternação – alguém ía atravessar a rua, foi atropelado e morreu – meu coração já estava para lá de mil batimentos por minuto e meu cérebro já imaginando o pior, pensei por quê não colocar um semáforo na esquina ou, quem sabe um quebra-mola para reduzir o ímpeto dos motoristas na avenida (Santa Leopoldina, em Coqueiral de Itaparica, Vila Velha, ES), que, com um retão destes ficam à imaginar que estão em alguma pista de Fórmula Um.
Bem, quando cheguei na sala e abri a janela, meus olhos não acreditavam no que viam, na avenida reinava a mais santa paz, sim, porque não havia aquele corre-corre característico de quem assiste a um atropelamento, então indaguei-me, será que era um sonho ou um pesadelo? Não, não era um sonho, muito menos um pesadelo, era real, pois logo a minha atenção foi despertada por um grito:
- Ai! Vai atropelar!
Para minha surpresa, olho bem para baixo, e vejo um grupo de crianças acocoradas sobre a grama do condomínio. Eram três garotos e uma menina, a maioria dos gritos partia dela, então pude perceber que se tratava apenas e tão somente de uma pequena experiência, tendo como protagonista uma lagarta que, deveria ou não, passar por cima de outro inseto, possivelmente uma formiga.
A minha primeira reação foi de raiva, claro, afinal de contas com toda aquela gritaria, só podia imaginar o pior. Depois, já refeito do susto e, um tanto bronqueado com as crianças, voltei para o meu quarto, para mais alguns minutos de descanso e, sinceramente, caí na gargalhada com a peça que as crianças me pregaram.
Depois lembrei-me do Pedro Bloch que era autor de umas crônicas na revista “Pais e Filhos” e, versava apenas sobre a gravidez, a saúde do bebê, além de lições sobre psicologia infantil, recordo que o título principal da página em questão era “Criança diz cada uma...”. À bem da verdade, cheguei a ler algumas crônicas, quando na oportunidade trabalhava em Campos em uma loja de revistas e jornais, mas cheguei mesmo a duvidar se, tudo aquilo não era apenas invencionice do Pedro Bloch, agora, depois dessa, mudei completamente de idéia e, pude realmente perceber que “Criança têm cada uma...”.

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